sábado, 24 de março de 2018

no tempo do outro senhor... ou talvez não.


Porque é preciso conhecer, entender, relativizar, avaliar, depreender, rebuscar e proteger.
Ficam alguns apontamentos dos muitos que se poderiam realçar,


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O alicerce da decisão
Tenho estudado alguma coisa do muito que me cumpria saber, não posso usufruir sobre tantos assuntos aquela deliciosa e descansada certeza em que bastantes espíritos, porque mais sagazes e menos exigentes, têm a felicidade de repousar. Mas, duvidando sempre da fraqueza da razão humana, também não vou ao ponto de não distinguir em muitíssimo casos a verdade do erro ou de dar a qualquer opinião, por mais absurda, o valor da contribuição valiosa para o progresso dos conhecimentos humanos ou para a boa marcha da opinião pública. Existe a verdade, simplesmente custa a encontrar, como os tesouros escondidos.
Ai do homem público cujo espírito fosse presa de eterna dúvida! Se é necessária a indiferença intelectual no decorrer da investigação científica, para a ação individual ou coletiva é indispensável a certeza, ponto de apoio do mando, alicerce da decisão.
Artigos (1930)

A crise da democracia
É natural que a crise da democracia, impossível de negar, se revele sob o aspeto de sucessivas crises políticas. Mas para quê jogar com as palavras? Quando a máquina se desarranja, frequentemente, por melhor eco e por mais vistosas engrenagens que possua, torna-se urgente pô-la de lado como um inútil. aproveitando-lhe, é claro, as inovações, tudo o que for suscetível de aplicar a outra máquina...
(...) Não é possível negar certas verdades e conquistas da democracia que são hoje indispensáveis à vida de todos os regimes. Mas os sistemas propriamente ditos, na sua inteireza, nascem, vivem e morrem como os homens. As escolas políticas e sociais são como escolas literárias. Esgotada a sua capacidade criativa, a sua flama, perdem a força, extinguem-se, depois de terem deixado a sua marca, o traço profundo da sua influência. Os próprios defensores da democracia procuram transigir com o espírito do seu tempo, confessando e admitindo a necessidade de modificar o sistema das suas ideias, de renovar os órgãos da democracia. Mas que propõem eles, afinal, para que se efetive essa renovação?
Medidas ridículas, que não se adaptam ao próprio sistema: ligeiras alterações no regulamento interno das câmaras, limitações no tempo do discurso, restrições no uso da palavra, etc, etc. Paliativos ingénuos que não resolvem nada, que pretendem, apenas, prolongar a pobre vida dum sistema agoniante... Negar a crise da democracia seria negar a evidência, o panorama político da nossa época...
Imprensa (1932)

Português sentimental e com horror à disciplina
Excessivamente sentimental, com horror à disciplina, individualista sem dar por isso, falho de espírito de continuidade e de tenacidade na acção. A própria facilidade de compreensão, diminuindo-lhe a necessidade de esforço, leva-o a estudar todos os assuntos pela rama, a confiar demasiado na espontaneidade e brilho da sua inteligência. Mas quando enquadrado, convenientemente dirigido, o português dá tudo quanto se quer...
Imprensa (1938)

A Ditadura é uma fórmula transitória
(...) sem dúvida que a ditadura, mesmo que considerada apenas como a concentração no Governo do poder de legislar, é uma fórmula política: mas não se pode afirmar que represente uma solução duradoura do problema político; ela é essencialmente uma fórmula transitória. Porque as ditaduras vastas vezes nascem do conflito entre a autoridade e os abusos da liberdade e, vulgarmente lançam mão de medidas repressivas da liberdade de reunião e da liberdade de imprensa.
(...)
E é em todo o caso um poder quase sem fiscalização, e este facto faz dela instrumento delicado que facilmente se gasta e de que facilmente se pode abusar. Por tal motivo, não é bom que a si mesma proponha a eternidade.
Discursos (1930)

Isto é ser pela democracia
(...) nós temos visto que a adulação das massa pela criação do "povo soberano" não deu ao povo, como agregado nacional, nem influência na marcha dos negócios públicos, nem aquilo de que o povo mais precisa - soberano ou não - que é ser bem governado. Nós temos visto que tanto se apregoam as belezas da igualdade e as vantagens da democracia, e tanto se desceu, exaltando-as, que se ia operando o nivelamento em baixo, contra o facto das desigualdades naturais, contra a legítima e necessária hierarquia dos valores numa sociedade bem ordenada.
(...) definir os direitos e garantias dos indivíduos e das suas colectividades, e estabelecê-los e defendê-los de tal modo que o Estado os não possa desconhecer e os cidadãos os não violem impunemente - isto é liberdade.
(...)
fomentar a riqueza geral para que a todos caiba ao menos o necessário multiplicar as instituições de assistência e educação que ajudem a elevar as massas populares à cultura, ao bem-estar, às altas situações de Nação e de Estado; manter não só abertos, mas acessíveis, todos os quadros à ascensão livre dos melhores valores sociais (...)

A necessidade duma reforma de instrução
(...) a grande maioria,  a quase totalidade, dos alunos que frequentam os nossos liceus, estão, no fim de sete ou mais anos de estudo, gastas as economias de seus pais, e alguns até o que legitimamente pertencia aos irmãos, absolutamente incapazes de por si ganharem a vida (...)

O desenvolvimento da razão
(...) a falta de originalidade dos nossos livros, e de tudo o que aprendemos, e de tudo o que sabemos e de tudo o que ensinamos; a pequena percentagem de verdadeiros sábios que o nosso povo fornece às ciências mormente experimentais; a falta de iniciativa e de independência intelectual fazem de nós apenas os eternos alfaiates da ideia (...)

Não se conduzem almas pelo medo
Não sei se ainda alguém pensa em conduzir almas pelo medo, sob a pressão terrorista de uma autoridade rígida. Mas profundas considerações cabalmente comprovadas pelos resultados práticos, devem, de há muito, ter feito cair, perante a consciência de todos os educadores, o mais falso e mais perigoso sistema educativo.
(...) Perante um coração de gelo, as almas são impenetráveis; evitam-no, não se lhe mostram tal como são; e a obra educativa ameaça malograr-se logo no seu começo.
A boa disposição da criança, a confiança, a familiaridade com que tratar o educador, e por ele for tratada, é o único meio em que pode ser estudado com verdade e precisão o mais oculto da sua alma."






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