terça-feira, 10 de julho de 2018

ESPAÇOS EM BRANCO (2)



Era nestes momentos que amaldiçoava o fato de ser tão teimosa.
Que mania esta de achar que valia sempre a pena tentar salvar a relação que se tem com quem, por um motivo ou por outro, se gosta de verdade.
Já em várias situações da sua vida tal característica se tinha revelado destrutiva e a tinha conduzido a sofrimentos interiores maiores do que os necessários, se soubesse, facilmente, largar os afetos que a vida afastava de si.
Nunca teve essa grandiosidade: nem de proteger boas amizades de circunstância das suas ausências e silêncios, nem de libertar aquelas que guardava com mais carinho. 
Era-lhe difícil sentir-se ligada, estabelecer uma relação profunda e verdadeira. 
Era-lhe difícil confiar, mas mais ainda, era-lhe difícil reconhecer interesse na personalidade de alguém.
Revelava-se improvável encontrar pessoas que se transformassem em objeto do seu desejo, da sua admiração, do seu reconhecimento, do seu respeito ou da sua empatia. 
Muito raramente se via envolvida com os outros, de modo a querer a todo o custo manter-se por perto. 
Dificilmente lhes conhecia maturidade para lhes contar as verdades, os segredos e as manias de que se revestia a sua vida e a sua forma de estar.
Nas suas buscas pelo autoconhecimento tinha concluído que, talvez por esse motivo, lhe fosse sempre tão difícil perder alguma das poucas pessoas de quem gostava instantânea e eternamente. 
Enchia-lhe o peito de amargura sempre que antecipava o desatar dos laços tão cuidadosamente apertados.
Entristecia-a de verdade saber que, em pouco tempo se perderia o privilégio de poder ser genuína, autêntica e que muito em breve as conversas se revestiriam do mesmo que todas as outras conversas com todas as outras pessoas: cuidado, reserva, meias verdades, meias respostas, parcialidades, silêncios. 
Era como se lhe ferissem o corpo sempre que as circunstâncias lhe levavam assim, tão cruelmente, uma pessoa que considerasse especial.

T. (2014)
(participação no projeto as-sukar no tema azulejos)

Para conhecer outras partes da história, ler as publicações da etiqueta Espaços em Branco (na barra lateral direita).



Carolina Francisco OHCRLN disse...

Preciso de ler mais!! Adorei a tua maneira de escrever :)
O que é o projeto as-sukar?

Teresa Margarida Costa disse...

Olá Carolina ☺ sim. A continuação está para chegar. As-sukar foi um projeto online em que um conjunto de pessoas recebia um tema, tinha um prazo para criar algo a partir daí. Enviava e depois os responsáveis publicavam os melhores. Mas já não existe. Foi um projeto com um prazo curtinho.

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