segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Rascunhos #3




“ Ao fim de tantos anos perdoo-te o que fizeste, embora não tenha a certeza se te desculpo o tempo que demoraste a confessar-te e o fato de após tantos anos me teres feito reviver tudo de novo”.


david uzochukwu

Havia demasiada percentagem de improbabilidade naquela relação.
Separavam-os:
doze anos de vida,
três graus académicos, 
cinquenta por cento de ordenado, 
cem quilómetros, 
o casamento de um contra a solteirice de outro,
o filho de um lado e o nenhum do lado de lá, 
a família num núcleo unido de um e o outro com um família separada em pedaços doentios e triste,
a alegria inerente a um, a depressão inerente a outro…

Mas das taxas de impossibilidade se criam as realidades e os dois iniciaram uma relação cheia de pontos profundamente distantes entre os momentos de felicidade e os de discórdia.
Ela tinha-lhe mostrado a doçura da vida, a facilidade, o colorido, a verdade, o iniciar dos projetos, a energia própria dos jovens, a luxúria, o afeto, a atração. 
Ele tinha-lhe dado a conhecer o respeito, a calma, a proteção, a disponibilidade, a maleabilidade, a admiração.
Até que ela se apaixonou por outro, abandonando-o sozinho ao seu desespero sem nunca lhe ter dito o verdadeiro motivo.


david uzochukwu

O remorso fez-me escrever-te.
Pensei muitas vezes ao longo deste anos em pedir-te a desculpa e assumir a verdade do que aconteceu.
Na altura não conhecia a força do verdadeiro amor, tal como não sabia o suficiente da vida para saber que não te amava verdadeiramente. 
Talvez tenha estado próxima de estar apaixonada por ti, mas estes anos mostraram-me que aquilo que me atraía para ti era o eu que se refletia no teu olhar, a fé e admiração que depositavas em mim, a facilidade com que encaixaste na minha vida, nas minhas rotinas, sem fazer mossa, sem tirar pedaço, sem incomodar.
Percebo agora que essa suavidade e pacatez não são bons indícios para uma relação. 
Uma relação forte  dá trabalho, angustia, modifica, acrescenta.
Ainda assim,nunca pretendi fazer-te sofrer, enganar-te, mentir-te, fazer-te mal. 
Mas fiz e tenho consciência da dimensão desse mal. 
Sempre tive e, por esse o motivo nunca consegui dizer-te a verdade,  acabando por te ser emocionalmente tão desleal.
Perdoa-me a fraqueza e a covardia.
Desculpa-me, se puderes. 
Em minha defesa apenas te posso dizer que não sabia que tal poderia acontecer. 
Não sabia que me podia apaixonar, não sabia que existiam emoções que me levariam a pôr a minha palavra em causa.

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