domingo, 23 de dezembro de 2012

Dá um pouco de crédito ao inexplorado...


Sempre fiz aquilo que se esperava de mim
Quando era pequeno comia a sopa toda sem chorar, ia onde a minha mãe queria sem a contrariar, tirava boas notas, dizia que sim aos professores, tirei um curso, o curso que o meu pai quis. Comecei a trabalhar na empresa do meu avô e finalmente casei com a amiga mais chegada da minha prima direita.
Tudo direitinho, certinho, “dentro dos conformes”
Não posso dizer que alguém me tenha obrigado a fazer alguma coisa que eu não quisesse. Na verdade sempre achei que dava muito trabalho ter opinião e depois bem via os problemas que os meus colegas mais “despachadotes” tinham para conseguir o que queriam.
Houve algumas coisas que quis verdadeiramente. Um específico computador, um específico telemóvel, dinheiro para comprar coisas de marca, um corpo musculado. Como as queria muito, fiz por isso e consegui, mas nunca ninguém me disse para não o fazer ou se mostrou desagradado ou teria imediatamente desistido.
Também houve uma ou duas raparigas que quis verdadeiramente. Uma não me quis a mim, apesar de eu me ter esforçado muito e ter até que ter andado atrás dela às escondidas da minha mãe.
Outra dava-me muito trabalho. Tinha muitas opiniões, dizia muitas vezes que não e estava mesmo a ver-me para o resto da vida entalado entre as vontades da minha mãe e as dela. Mais uma vez, era muita confusão e a amiga da minha prima também não estava mal e dizia sempre que sim.
Casámos rapidamente. O dinheiro abundava e o emprego também. Há uns dias perguntou-me o que achava da ideia de termos filhos.
Na verdade não acho nada. Não tenho grande vontade de ouvir aquelas vozes esganiçadas a chorar, choramingar ou a gritar a toda a hora, com ranho no nariz e as mãos sempre sujas de uma coisa qualquer, mas é o que se espera de mim…
Por isso disse que achava bem…
Ontem quando cheguei a casa deprimi logo com os chinelos rosados e as calças de fato de treino. Sei que é roupa confortável, mas já raramente a vejo vestida como quando a conheci. Quando chego a casa está assim e ao fim de semana não me tem apetecido sair.
Não sei. Acho que esperava que ela cozinhasse, tratasse da roupa e limpasse com as blusinhas que sempre lhe vi e com aquele sorrisinho inocente que sempre me deu enquanto namorávamos.
Não que ela se tenha descuidado. Não. Continua a ter sempre a mesa posta e o jantar preparadinho à minha espera. Quente e acompanhado com um sorriso e um “como foi o teu dia.”
A questão é que já não posso ter mais esta conversa desinteressante e enfiar-me novamente no sofá a consumir programas de debate político.
Tenho um amigo que me diz para me agarrar à internet. Sempre dá para “lavar as vistinhas” e “distrair um bocado”, diz ele. Sei a que ele se refere e sei bem que ele não fica só “agarrado” à internet.
Já pensei nisso! Até já criei um perfil num desses sites de encontros, mas nem isso me anima.

Vejo na placa da auto-estrada o aviso da minha saída à direita.
Deixo-a passar.
Sigo em frente, mas não sei para onde.
Vou para onde não é esperado, faço o que não está dentro dos conformes.
Daqui uns dias volto e tudo me será perdoado porque sempre fui um bom menino.
Mais lágrima, menos lágrima, tudo será esquecido e daqui a uns anos voltarei a ser aquele que sempre fez aquilo que se esperava dele.
Anónimo disse...

Ola,

Conta lá, de que livro é esta passagem? Parece interessante para ler nas ferias.

Bj. Fernando

Teresa Margarida Costa disse...

:) Vou aceitar isso como um elogio, mas o livro... esse... ainda não foi escrito ;)

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